Um Domingo Qualquer



- Alô?

- Felipe?

- Oi Vera. Fala.

- Tá tudo bem? Tô te achando meio desanimado.

- Tudo bem sim. Por quê?

- É que você não saiu na sexta-feira. A gente ficou te esperando. Você disse que iria.

- Não fiquei com vontade. Não sei. Eu...

- Felipe. Eu te conheço tem tempo. O que foi?

- Tô ocupado agora.

- Fazendo?

- Olha Vera, não me leve a mal, mas não estou com vontade de falar.

- Eu sou sua amiga.

- Sim.

- O que é?

- Estou desanimado. Muito. Muito mesmo. Além da conta.

- Tá. Se arrume então.

- Por quê?

- Eu e o Carlinhos vamos passar aí para te pegar.

- E fazer o quê? Ah não. Eu não estou a fim de sair.

- Vai sim! E acho bom abrir a porta quando a gente chegar. Não, melhor. Fique esperando a gente na calçada, aí você pula no carro.

- Vera, hoje é domingo.

- Então. É o dia internacional do passeio com a melhor amiga!

- Não. É o dia internacional de ficar sem fazer nada.

- Negativo.

- Vera, eu não quero!

- Só um momento. – Carlinhos, já se arrumou? A gente vai passar na casa do Felipe, tá? – Pronto. Tudo certo. Tchau Felipe, até daqui a dez minutos.

- Mas, mas...

Dez minutos depois.

- Viva! Saiu de casa.

- Ok, eu vou junto. Mas não sou obrigado a fazer rosto bonito.

- Entra de uma vez no carro.

- Oi Felipe, tudo bom?

- Oi Carlinhos. Tudo. Mais ou menos.

- Não fica assim não cara!

- Aonde a gente vai?

- Para a praia. Quero andar um pouco na areia e ver o mar.

- Pô Vera, mas eu vim de tênis.

- Felipe, é só tirá-lo. Não fica inventando desculpa barata para não ir. A gente vai e ponto final.

- Tá mãe!

- Meu amigo lindo.

- Olha essa intimidade aí de vocês.

- Carlinhos, eu o conheço desde a oitava série.

- Eu sei disso.

- Você é o meu namorado. Ele o meu amigo. Namorado. Amigo. Sentiu a diferença?

- Sua boba.

- Vamos agora? O que é isso, Felipe?

- Meu fone de ouvido?

- É. Nada de ouvir música, meu querido! Vamos conversando, curtindo a amizade. Quanto tempo faz que a gente não saia junto?

- Que legal. Vai ser tão divertido. Pronto, tirei o fone. Feliz?

- Olha Carlinhos, como ele fica mal humorado.

- Vera!

- Liga o carro. Com sorte a gente tira umas fotografias de umas gaivotas.

- Ótimo. A máquina está aqui prontinha.

- Tirar fotos de gaivotas? Tenho certeza que a TV da minha sala está mais interessante.

- Não dá bola Carlinhos. Logo o Felipe começa a sorrir.

Dez minutos depois.

- Que lindo esse lugar. Olha lá aquele morro. Quantas casas. Isso não era assim antes. Como as coisas mudam!

- Falta muito para chegar?

- Aproveita o passeio Felipe, não fica de mau humor.

- Não é isso. Eu quero comer alguma coisa. Saí sem fazer lanche.

- A gente trouxe umas guloseimas, né Carlinhos?

- É, mas minhas mãos estão ocupadas. Pega pra ele. Tem sanduíche de atum, suco de uva, bolachas.

- O Carlinhos fez uns sanduíches para você também, Felipe.

- Maravilha...

- Está começando a sorrir. Eu sabia. Nada como um passeio para alegrar as coisas.

- Vou pegar esse aqui. E também um pouco de suco.

- Não derrama nada no chão. Eu lavei o carro essa semana.

- Carlinhos, ele vai cuidar.

- Vera, você se lembra daquela vez, quando a turma foi pescar às quatro horas da manhã?

- Sim! Carlinhos, essa história que o Felipe lembrou é muito boa! Eu estava dormindo na barraca quando os meninos vieram e me tiraram de pijama e tudo para sair com eles.

- E você foi? Eu não lembro dessa história.

- Eu não te contei então. Fui sim. Estavam todos de pijamas.

- E pescaram alguma coisa?

- Que nada. Mas só a diversão valeu. Rimos até de manhã. E depois tomamos um banho de mar.

- No final eu torci o pé!

- É verdade Felipe. Ainda tiveram que te carregar. E o pessoal do mercado que viu a gente andando de pijama às nove horas da manhã? Hilário. Muita comédia.

- Valeu mesmo. Tenho saudade daquele tempo.

- Eu também. Nunca mais falei com o JP.

- Também não. Perdi o contato com a Greice, o Tiago, o Monstro, a Isa, o Valtinho, a Regina. Por onde anda essa turma toda?

- A gente podia marcar um encontro, que tal?

- É, mas hoje o pessoal tem outros afazeres. Tão namorando, estudando fora, trabalhando.

- Por falar nisso, como está o seu namoro com a Sandra?

- Ah Vera, nem queira saber. Talvez por isso eu esteja desanimado. É que a gente não combina.

- Tão ruim assim?

- Foi bom enquanto rolou.

- Vocês terminaram? E nem me falasse nada.

- Terminar, terminar, a gente não terminou. Mas na minha cabeça já era. Pedi um tempo.

- Você trabalha numa relojoaria Felipe?

- Carlinhos, que comentário!

- Desculpa Vera, desculpa.

- É uma pena ouvir isso Felipe. Eu achava que vocês formavam um belo casal.

- A gente sabia fazer pose para as fotos. Só isso.

Dez minutos depois.

- Gente, a praia tá cheia.

- Eu vou pegar a toalha e o guarda-sol. Vocês pegam a comida. Vou escolher um lugar para ficarmos.

- Certo Carlinhos. Dá uma ajuda aqui, Felipe?

- Deixa que eu pego. Você pode soltar, eu seguro.

- Ficou pesado. Valeu.

- Pronto. Onde o Carlinhos foi?

- Não sei, não o vejo daqui. Tem muitas pessoas na areia.

- Vera?

- Sim?

- Gostei da nossa conversa na viagem.

- Também. Foi bom relembrar.

- Vera?

- O quê?

- Não gostei de ficar lembrando da Sandra.

- Desculpa. Deve ser difícil para você.

- Não é isso. É que eu nunca gostei dela. Direito. Estava junto mais para não ficar sozinho. Eu sabia que não daria certo.

- Olha. Acho que eu avistei o Carlinhos. Não, não é ele.

- Vera?

- Sim?

- Esquece o Carlinhos.

- O quê?

- Talvez eu apanhe depois. Talvez você fique brava comigo. Quem sabe eu tenha até que voltar a pé. Não me importo.

- Eu acho melhor...

- Vera, me escute. Eu estava muito desanimado hoje lá em casa. E quando você me ligou, me senti muito bem. Aquela chateação foi embora só de ouvir a sua voz. Gosto muito de você.

- Também gosto da nossa amizade.

- Mas é mais, Vera. Não posso me enganar. Eu gosto muito de você.

- Ah Felipe, que droga.

- Sabia que você ficaria chateada. Mas iria passar mal se não falasse.

- Cala a boca, eu também gosto de você. Desde a oitava série.

- A oitava série? Mas, quanto tempo faz isso?

- Um monte. Nunca imaginei que esse dia chegasse de verdade, porque você sempre teve suas namoradas.

- Sim, eu tive. Mas nós mantivemos um carinho muito grande esse tempo todo.

- Ai.

- Você é linda Vera.

- Beija logo Felipe.

- Mas, e o Carlinhos?

- Quem?

- Acho que estou sonhando.

- Depois a gente come uns sanduíches de atum. Hahahaha.

- Vem cá. Vamos tirar o atraso dos beijos.

- Olha lá. Eu só tenho uma boca. Hahahaha.

- Para de rir. Sou eu que vou apanhar depois. Hahahaha.

F I M

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