Na Montanha Fria e Escura

Na montanha fria e escura
Um vento gelado cortava os corações
de seres que não tinham outra escolha
Além de se aquecerem mutuamente

Cobertos de neve,umidade e desespero
Homens e mulheres choravam copiosamente
Crianças balançavam mãozinhas trêmulas
Em busca de um alimento inexistente

Debalde dedos em riste
Procuravam culpados
Acusando líderes, a má sorte, os deuses
Até mesmo a montanha era a causadora de todos os males

Entretanto, um deles
Mais velho, taciturno e arredio
Foi solicitado a se expor
E ele disse:

Pois que! Culpam todas as coisas.
Mas nos dias quentes de verão
Ninguém se lembrou de guardar víveres
Nem de estocar lenha seca

Nas tardes amenas da primavera
Quando casais desabrochavam com as flores
Quem de nós soube pensar no inverno
Que ainda estava longe?

Eis agora nossa realidade:
Pagamos caro por essa afronta
Pagaremos com nossas próprias vidas
Aos deuses não podemos nos queixar

Fomos dotados de braços e pernas
Vistas boas e ouvidos bons
Tínhamos tudo para conseguir
Preferimos ficar na ociosidade

E agora culpam até mesmo esta montanha -
Única que nos cedeu abrigo?
Afinal, lá embaixo está molhado e congelado
E não duraríamos mais que uma lua?!

Não, não contem comigo
Deixem-me aqui sozinho
Pensativo, nas minhas súplicas
Aos deuses...

Que eles me concedam nova chance
De renascer, se é que isso é possível
Mas que essa chance seja bem longe de vocês
E que eu possa nascer entre um povo lúcido e inteligente!

E ao dizer isso, retirou-se para o interior da caverna, de onde nunca mais saiu.
Os demais ficaram entreolhando-se, sem entender nada. Mas sabiam que suas esperanças estavam despedaçadas.

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