Peixe no Aquário - primeira parte

Meu nome é Estevão.
Estava de férias. E meus pais pagaram uma viagem de estudos para a capital da França, Paris. Todo faceiro e orgulhoso, fui viajar. Com 18 anos. Estudava francês desde os 16. Os meus acompanhantes eram estudantes pré-adolescentes na faixa dos 14, 15 anos.
Naquele mês de julho de 2005, frio para os blumenauenses e verão na França, eu parti. Não dominava bem a língua. O meu esforço seria o de aprender mais e ser capaz de realizar ações normais, como comprar comida, sair de noite, ler e estudar numa escola, me expressando em outra língua. Mas, não vou mentir aqui, o objetivo principal era mesmo sair de casa.
Cansado, me sentia preso. Meus pais não me deixavam fazer quase nada, e eu estava constantemente vigiado. Com 18 anos, não havia feito quase nada do que meus amigos e colegas já haviam feito. Meu pai não me emprestava o carro, porque não me considerava maduro o suficiente. Minha mãe regulava as vezes que eu poderia sair de noite, porque tinha medo de assaltos e também para o meu destino ser diferente do meu irmão mais velho, viciado em drogas e pai de duas crianças com 22 anos. Hoje ele se encontra numa clínica de reabilitação. Mas e daí? Não sou ele. Minha cabeça é diferente. Mas como vou saber o que é certo e errado, se não passar pela experiência?
Por isso, quando soube da oportunidade do intercâmbio, não pensei duas vezes. Nunca fui de estudar muito, mas naqueles seis meses que precederam a viagem, eu devorei os livros didáticos, ficava até mais tarde na aula tirando dúvidas com os professores, assistia aulas extracurriculares e de reforço e abdicava dos sábados e domingos de manhã para participar de reuniões preparatórias do intercâmbio com os professores e alunos.
Tal atitude impressionou os meus pais, que bancaram a viagem, com a certeza de que eu traria uma bagagem cultural aprimorada. Eu queria uma bagagem sim, um pouco de cultura por certo, mas meu foco era a experiência de vida.
Éramos 20 estudantes ao todo, mais 03 professores. Cada um de nós ficou na casa de uma família francesa, todos alojados no mesmo bairro residencial de Paris. Diariamente uma van passava pelas casas e nos levava para o Centro de Estudos Franceses daquela cidade, entidade conveniada com a nossa escola lá de Blumenau. Ali, passávamos quatro horas estudando geografia, história, artes, filosofia e a cultura francesa. Depois fazíamos um passeio por museus, parques, shoppings e outros espaços públicos da cidade, sempre falando francês ou pelo menos, na maior parte do tempo.
Eu fiquei na casa da Família Noumel. Jeane era uma mulher de 45 anos, dona de um ateliê de costura. O seu marido, Nicolas, um empresário do ramo doceiro. Uma família típica da classe média francesa, com dois carros na garagem e uma cozinha maior do que a sala e o quarto da minha casa combinado. Eles tinham um filho, que estava morando no Canadá, estudando para ser farmacêutico. Jeane e Nicolas eram pessoas amáveis, receptivas e bondosas. Melhor do que isso: tinha toda liberdade possível. Eles me forneceram a cópia das chaves de casa e não impuseram horários para voltar, desde que eu não os acordasse. Confiaram em mim no primeiro minuto e eu neles. Se meus pais fossem assim...
No primeiro final de semana, eu e os estudantes do intercâmbio tivemos a oportunidade de viajar para o Vale do Loire, e conhecer os castelos dos antigos nobres e reis franceses. Seria uma jornada interessante para mim. No dia aprazado, Jeane e Nicolas bateram na porta de meu quarto, quando estava arrumando a mochila. Fiquei estupefato. Convidaram-me para uma festa na sua residência, por ocasião do aniversário de um sobrinho muito querido deles e faziam questão da minha presença. Aceitei.

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